Como se preparar para o mundo novo (pós quarentena)?
O mundo já não é mais o mesmo e você sabe disso. O colapso ocasionado pelo
coronavírus não atingiu apenas a economia, a sociedade, a saúde, a educação. A crise tem
nos permitido repensar nossos próprios valores, nossa forma de pensar e agir no mundo, e
tem servido como uma lente de aumento que revela desconfortos escondidos na
“normalidade” da antiga narrativa.
Ailton Krenak, em seu novo livro “O amanhã não está a venda” (disponível gratuitamente na
Amazon), comenta: “Não sei se vamos sair dessa experiência da mesma maneira que
entramos. […] Tem gente que suspendeu projetos e atividades. As pessoas acham que
basta mudar o calendário. Quem está apenas adiando compromissos, como se tudo fosse
voltar ao normal, está vivendo no passado. O futuro é aqui e agora.”
Desde o início da crise, temos visto políticos, empresários, instituições, governos e
mercados financeiros buscando um resgate da situação existente antes da pandemia, em
um claro apego à velha história que já conhecemos e sabemos das inúmeras falhas. Seria
realmente possível passarmos pelo caos e retornarmos à vida exatamente como éramos
antes? Ou mais importante, realmente desejamos que isso aconteça?
Se não podemos desejar voltar à normalidade, porque a normalidade era justamente o
problema, então precisamos co-criar uma nova normalidade. Queremos um mundo novo,
mas como? Separamos para você 8 práticas para adotar pós quarentena para auxiliar na
mudança do mundo. Muitas delas já podemos começar agora!
- Abra sua cabeça! Questione o modelo atual e imagine o futuro.
- Reserve um tempo sagrado no seu dia para você.
- Veja a natureza como mentora.
- Quando necessário comprar algo, apoie os pequenos produtores locais!
- Crie seu banco de sementes e comece uma horta em casa!
- Separe seu lixo, monte uma composteira! (use o mínimo de plástico possível)
- Monte uma comunidade no seu bairro.
- Como posso gerar mais vida em tudo que faço? Aprenda mais sobre
regeneração.
1- Abra sua cabeça! Questione o modelo atual e imagine o futuro.
“As perguntas são o caminho para sabedoria coletiva.” diz Daniel Wahl, escritor do livro
Design de Culturas Regenerativas. Para fazer algo novo, precisamos começar
questionando o que queremos mudar. Porque o que estamos fazendo hoje não é mais
adequado para o momento que vivemos? Que outras formas de viver podemos escolher?
Abrir a cabeça é fundamental para aceitar a diversidade potencial da vida. Se estamos aqui,
nesse ponto da história, é porque coletivamente caminhamos até essa direção. Assim,
coletivamente podemos questionar nossos próximos passos e construir uma outra história
para viver. O momento é agora de deixar a imaginação fluir e sair fora da caixinha. Leia
sobre novas formas de existência com mais significado, sobre pessoas que estão
transformando suas vidas através da permacultura, ou outras que estão aprendendo sobre
a vida com nossos povos tradicionais e abra seu coração para a mudança transformadora.
2- Reserve um tempo sagrado do seu dia para você.
A partir da transformação interna podemos sentir a mudança que queremos ver no mundo.
Esse processo precisa ser de dentro para fora para ser verdadeiro, algo que não estamos
acostumados, pois vivemos nossa dia a dia mais preocupados com o que está externo a
nós. A quarenta com certeza nos ensinou a importância da calma. Quando seu mundo
interior está tranquilo e claro, você consegue manifestar exatamente aquilo que deseja. A
importância da conexão consigo, com seu coração, com sua essência é a base da
transformação que vamos viver, e você precisa estar preparado. Mudanças não são sempre
fáceis, mas são reais quando vêm do nosso ser. Assim, tudo que você fizer na vida virá de
forma autêntica e leve, pois não há esforço no tempo da alma.
3- Veja a natureza como mentora.
Nossa visão antropocêntrica muitas vezes nos faz acreditar que somos os seres
mais evoluídos do planeta, que somos superiores e portanto mais sábios. Porém, desde o
momento do surgimento da primeira forma de vida na Terra (há cerca de 3.8 bilhões de
anos), até o surgimento do primeiro homo sapiens (há cerca de 350 mil anos anos), a
natureza teve uma vantagem de aproximadamente 3.799.650.000 anos (!) para errar,
aprender, e evoluir. Se a idade da Terra fosse o equivalente a um ano do nosso calendário,
teríamos aparecido sobre a face do mundo a meros 15 minutos e toda nossa história teria
se passado nos últimos 60 segundos. Enquanto isso, a vida aprendeu a se desenvolver no
ar, nas profundezas do subterrâneo, mergulhada nos oceanos e no topo das montanhas
mais altas. Aprendeu a se curar, a produzir o veneno e o antídoto, a armazenar energia
através do sol, a transformar os ambientes mais hostis em lares aconchegantes com
temperaturas estáveis, a produzir através de processos cíclicos sem qualquer tipo de
desperdício. Em suma, a natureza já tem as respostas para muitos dos problemas que
tentamos resolver. Observar como ela encontrou essas soluções e entender seus princípios
de funcionamento pode ajudar os humanos a também evoluírem. A sabedoria está em toda
parte, e quando aprendemos a olhar ao nosso redor através das lentes da regeneração,
conseguimos perceber as soluções presentes diante dos nossos olhos. Exercitar esse olhar
é uma forma inteiramente nova de abordar a vida para uma humanidade acostumada a
“dominar” a natureza e, aos poucos, deixarmos a posição de seus exploradores para
humildemente nos voltarmos à ela em busca de orientação.
4- Quando necessário comprar algo, apoie os pequenos produtores locais!
A localização é um dos princípios mais importantes da regeneração. Quando valorizamos a
produção local, criamos resiliência para o sistema de produção e consumo, respeitamos a
terra onde estamos e criamos uma relação com o local que vivemos. Além de incentivar a
economia do nosso entorno e diminuir o uso de petróleo (e consequente emissão de
poluentes na atmosfera) nos transportes de longa distância. Ao construirmos relações
profundas com os produtores, entendendo o processo e os valores das marcas/pessoas
que apoiamos, contribuímos com o fortalecimento da visão de mundo que acreditamos, com
a descentralização do poder concentrado nas mãos das multinacionais e com a distribuição
da renda de forma mais horizontal e localizada.
5- Crie seu banco de sementes e comece uma horta em casa!
Além de ser um ato de grande aprofundamento da sua relação com a natureza, para criar
resiliência no sistema precisamos que todos participem da produção de comida. Ter uma
horta em casa traz ensinamentos que muitas vezes não reparamos de primeira, como o
cuidado com uma vida que vai nascer, o processo lento e belo da evolução a cada dia, o
fruto do esforço e da paciência, a importância de nutrir um relacionamento e tantas outras
lições de vida que o mundo das plantas tem a nos ensinar.
Para o banco de sementes, basta retirar as sementes dos alimentos que consome e deixar
no sol por alguns dias até tirar a umidade. É importante que você retire todos os restos de
comida. Depois faça pequenos envelopinhos de papel e guarde as sementes na geladeira.
É importante que você identifique e coloque a data. Quando decidir plantar é só deixar de
molho na água antes de plantar na terra.
6- Separe seu lixo, monte uma composteira! (use o mínimo de plástico possível)
Resíduos orgânicos como cascas de frutas demoram de 1 a 3 meses para se decomporem
totalmente, já plásticos ficam pelo menos 450 anos no meio ambiente. Tentar montar uma
composteira na sua casa, ou uma composteira coletiva para seu prédio/bairro é uma forma
linda de ressignificar o que você via como lixo se transformar em solo fértil pronto para
amparar uma nova vida, além de ser uma ideia divertida para aproximar sua família ou seus
vizinhos na construção de algo coletivo. Também existem diversas iniciativas que recolhem
seus resíduos orgânicos e te retornam mudinhas plantadas no solo adubado pelo seu lixo,
em troca de uma contribuição mensal! Quanto aos resíduos não orgânicos, precisamos
reduzir, reutilizar e reciclar o máximo possível. E a produção futura? Precisamos pressionar
os governos e empresas para implantação de processos circulares. A economia circular é
um ótimo tema para você pesquisar sobre 😉
7- Monte uma comunidade no seu bairro
Vivemos em bairros cheios de outros seres. Agora é o momento de nos conectarmos com
aqueles que estão à nossa volta! Nos unir, apoiar, ter ideias e realizar projetos juntos para
que o lugar em que vivemos viceje ainda mais! Pense, imagine sem limites tudo que você
gostaria de ver regenerar no seu bairro, chame os vizinhos e idealizem juntos. Montem
comunidades, mesmo que sem contato físico! A comunidade é a ponte entre nós e o
mundo, nossas experiências coletivas nos conectam e fazem essa ligação com o todo, nos
dão a sensação de que somos parte de algo maior. Nós perdemos essa conexão verdadeira
com os vícios da modernidade individualista, e está na hora de resgatarmos nosso senso de
comunidade.
8- Como posso gerar mais vida em tudo que faço? Aprenda mais sobre regeneração.
Quando estudamos somos provocados a nos abrir para diferentes visões de mundo. A
regeneração desafia o modelo atual que vivemos e traz questões fundamentais para
fomentar transformação cultural. Vivemos hoje de forma degenerativa. Vivemos extraindo
tudo do meio ambiente e nossa volta sem a preocupação em dar algo de volta. A natureza
se comporta de forma cíclica e nosso pensamento hoje se dá de forma linear, algo não está
certo. Aprender sobre regeneração traz mudanças na base do nosso ser, onde a cada ato
nos questionamos se estamos gerando mais vida ou não. Queremos deixar um mundo para
que as próximas gerações floresçam e não tenham que “tapar” nossos buracos.
Acreditamos que essas 8 ações simples são os primeiros passos rumo à um futuro mais
bonito, que leva em conta a diversidade, a resiliência, a colaboração e a regeneração como
bases primordiais. Apesar de parecerem minúsculas, essas experiências de (re)conexão
com a Terra são como o vento que assobia sobre uma fagulha e a transforma em chama.
Charles Eisenstein diz que quando uma pessoa passa por uma série de iniciações na nova
história, ela fortalece sua posição dentro desse território e assim pode abrir espaço para
outros. Assim, sejamos como fagulhas luminosas levadas pelo vento, que espalham a
semente da regeneração e que fornecem uma chama viva, forte e que queima – mas que
nunca se apaga. Que esse fogo nos torne mais resilientes e abertos para o novo mundo
que precisa de espaço para nascer.
Por Thais Mantovani e Anna DeNardin do @FuturoPossível