Roupa, meio ambiente e pensamento imagético

Foto de Public Domain Pictures no Pexels

Seu armário está abarrotado de roupas e você sente que, mesmo assim, nunca tem o que vestir? E o que isso tem a ver com o meio ambiente? Vou te contar brevemente a minha trajetória que me fez entender, hoje, a relação entre minimalismo, estilo pessoal e liberdade de expressão por meio das nossas roupas. Isso mesmo, é sobre as roupas que já estão bem aí no seu armário. ☺

Muitos ainda insistem em subestimar o impacto da nossa vestimenta na nossa vida, mas as roupas, além de serem um meio de expressão pessoal e um espaço de criação livre, podem nos ajudar a repensar nossa relação com as coisas, e com o nosso ritmo de consumo. Uma verdadeira revolução verde? Sim, é o potencial que vejo nelas.

Muito prazer por você estar me lendo aqui. Eu sou Dandara Dantas, designer e artista visual, nova colunista do Vivoverde e nova moradora de Palmas, Tocantins. É mesmo muita novidade para mim, mas a maior delas foi eu ter me mudado do Rio de Janeiro há três meses, com apenas duas malas. De fato, eu empacotei a minha vida mais facilmente do que eu poderia imaginar por, naquele momento, já possuir muito menos coisas do que eu já tivera há alguns anos. E essa experiência de botar a casa nas costas me fez enxergar que posso colocá-la e me mudar novamente, se for preciso, sem o peso aprisionador dos objetos que a gente acha que precisa ter. É um caminho sem volta, ao menos para mim. Por isso, gostaria de inaugurar essa coluna compartilhando esse meu processo desafiador, repleto de autoconhecimento. 

Foto: Antônio Jr.

Eu amo criar imagens. Minha pesquisa de doutorado, inclusive, defende que pensamos por meio da imagem, antes mesmo de desenvolver um raciocínio linear, conceitual. Para mim, pensar é imaginar e vice-versa, e é onde está nossa distinção em relação às máquinas, assunto que assola artistas e cientistas: será que os robôs nos superam? Meu palpite é que não pelo fato de eles (ainda) não conseguirem imaginar, mas isso é assunto para outra hora. Meu fascínio por imagens me levou à graduação em comunicação visual, que exercitou minha imaginação para projetar imagens bidimensionais, como livros e revistas, o tal Design Gráfico. No mestrado, em Artes visuais, comecei a expandir essas imagens para outras dimensões do corpo por meio de performances interativas e, nessa, meu pensamento foi se expandindo junto. No doutorado interdisciplinar, refleti sobre o pensamento imagético e como ele está presente no design, nas artes e nas ciências. 

Após defender essa tese, senti que precisava enfrentar uma grande mudança de vida. O Rio de Janeiro, agitado e tenso, estava me deixando igual a ele. Por isso que o amor pelo André, hoje meu companheiro, e o sossego de Palmas, onde ele já morava, me fizerem repensar o meu imaginário afetivo de casa. E resolvi me mudar. Mas o que me permitiu realizar essa mudança, como eu disse, foi eu já estar há algum tempo refletindo sobre a quantidade de coisas que eu preciso para viver bem. E percebi que, ao longo de alguns meses, à medida que eu me desfazia de objetos, minha vida se descomplicava, eu ganhava mais tempo e menos preocupação. Mas confesso que foi um processo lento e desafiador, que começou com uma limpeza no armário.

Notava que eu demorava demais para me vestir, gastava demais em lojas e estava constantemente insatisfeita com o meu armário e comigo, por meio dele. Foi quando conheci o método da organizer japonesa Marie Kondo de só manter ao nosso redor o que nos dá alegria, e esbarrei na reflexão minimalista que nos provoca a pensar: o que é realmente essencial para viver? Nessa busca, me dei conta também do modelo de produção da indústria têxtil, que se alimenta do consumo desenfreado e esgota o meio ambiente, incluindo a nós mesmos. Senti que era preciso agir, de dentro para fora, mudando os meus hábitos. 

A minha revolução começou no guarda-roupa. Defini uma paleta de cores que eu gostava e reduzi meu armário a essas cores, mantendo só as peças que me alegravam ao me vestir. Assim, além de eu gostar e realmente usar muito as peças selecionadas, todas elas (blusas, calças, saias e casacos) se coordenavam entre si e rendiam mais novas combinações do que eu normalmente fazia, pois, pelo fato de serem poucas, eu facilmente enxergava tudo que tinha. Conclusão, esse sistema que eu bolei me facilitou tanto a vida que eu passei a pensar mil vezes antes de adquirir qualquer peça nova e, caso eu cogitasse comprar, era fácil decidir se ela faria ou não sentido no armário, pois rapidamente eu podia me lembrar de todas as minhas roupas.

As compras diminuíam e as descobertas se multiplicavam. Assim, a redução do guarda-roupa começou a se estender pelo resto dos meus pertences: sapatos, bolsas, documentos, maquiagem, produto de higiene pessoal, itens de cozinha e objetos de decoração. Finalmente, me restavam mais espaço e tempo para me dedicar ao que realmente importa, e que não está à venda. Pude, então, me mudar para essa cidade tranquila que só me estimula a sair ainda mais das velhas conhecidas zonas de conforto. 

Hoje, trabalho com consultoria de estilo. Meu objetivo é contar essa história e incentivar sobretudo mulheres a se libertarem de padrões estéticos e a viver com menos por meio da descoberta de seu estilo pessoal. É mesmo uma grande investigação interior, que te faz observar sua personalidade e seu estilo de vida, já que estilo pessoal vai muito além das roupas. Descobrir sua maneira própria de se vestir é libertador e te faz questionar todo esse modelo de consumo insustentável que é vendido às custas da nossa autoestima. 

Nesta coluna, enfim, espero dividir minhas reflexões sobre este trabalho e sobre estes assuntos que tanto me interessam e se relacionam cada vez mais, ao meu ver, de forma urgente e fundamental: criação imagética por meio das roupas, meio ambiente, subversão e liberdade. Vamos fazer essa revolução?

Dandara Dantas

Dandara Dantas é graduada em Comunicação Visual, Mestra em Artes Visuais e Doutora interdisciplinar em Arte e Ciências pela UFRJ. Pesquisa criação imagética por meio das roupas e atua como consultora de estilo com foco em minimalismo, em uma perspectiva brasileira e feminista. Compartilha pensamentos e experimentos no instagram pelo perfil @maiscoremenoscoisa Contato: estilovivoverde@gmail.com

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